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Esta é uma obra de ficção dedicada a ninguém.

7 de abril de 2014

Vestido de enterro.

Coloquei aquele vestido que você odiava, preto e longo, aquele que você dizia ter cara de luto e que escondia todas as minhas curvas. Coloquei-o para mostrar pra mim mesma o quanto sua opinião nunca me importou. Cheguei a festa e por um momento tive a impressão de possuir todos os olhares. Esse é o meu problema, eu nunca percebo as coisas. Sentei de frente ao palco, pois fui ao meu show preferido - sertanejo modão. Fiz o percurso até a mesa, senti o silêncio imenso que estava. Talvez você tivesse razão, esse meu vestido lembrara luto. Todos talvez estivessem tristes, ou abismados, ou simplesmente assustados com o meu vestido te enterro. Senti-me mal me lembrando que as vezes você sempre tinha razão, e essa vez era uma delas em que eu deveria ter te ouvido e colocado outro vestido.
Encontrei alguns velhos amigos. Começou o show. O "show" era daqueles bem simples onde os cantores iam por diversão, todos eram amigos, e haviam vários para subir no palco. Todos começaram a dançar e eu sempre odiei isso. Dançar com desconhecidos, poupe-me. Prefiro ficar na cadeira apreciando a música boa e pensando na vida. 
Tive a impressão de que toda hora chegava alguns grupinhos de homens e ficavam me encarando. Como sempre eu fiquei com um certo receio. Ninguém me chamou para dançar. Passava muita gente, olhavam, pensavam, e não vinham. Talvez fosse o meu vestido. O cantor cantava e olhava para mim, ou para o meu vestido de enterro. Acho que estava o assustando, pois ele cantava, olhava e  dava um sorriso. Meu Deus, porque eu não coloquei outro vestido? De morta já basta a cara e as olheiras. 
Chegaram um grupo de cantores, mas esses eram diferentes, eles aparentavam ser bem mais jovens beirando os 18 anos. Camisa social preta e bota de cowboy. Começou a fica interessante. Antes de subirem no palco sentaram na mesa ao lado da minha, olhavam e cochichavam. Puta merda, esse vestido tá me tirando do sério. Subiram no palco e cantaram suas músicas, mais uma vez tive a impressão de que estavam olhando pra mim. Olhei pra trás pra ver se tinha algo e percebi que tinha mais gente olhando na minha direção. Levantei para ir embora, porém rapidamente meus amigos vieram e me fizeram mudar de ideias, mas nada do que falaram foi relevante. Saudades da minha amiga que me apoiava e compreendia todas as minhas psicoses, e até via as mesmas coisas que eu. Se ela estivesse aqui com certeza pensaria a mesma coisa, cadê aquela filha da puta?
O show acabou, graças a Deus, porém ficou um cantor no palco - aquele integrante do grupo dos mais jovens - e disse que cantaria a música para alguém especial que ele viu hoje. Repertório perfeito e por incrível que pareça eu sabia todas as músicas. Nesse momento várias pessoas já tinham ido embora, tinha cerca de umas 15 pessoas apenas no local. Ele cantou várias músicas que no momento não lembro o nome de nenhuma, cantava e olhava para mim. Os amigos dele estavam nas cadeiras do fundo gritando e apoiando o amigo a cantar. Ele cantou versos que basicamente incluía "quero você aqui" "te vi e me apaixonei". Comecei a ficar sem graça, vermelha e sozinha na mesa. Toda vez que ele cantava e olhava para mim ouvia uma onda de incentivação dos amigos.
Até que quando disse que aquela era a sua última música, senti uma tristeza por um momento. Acho que estava encantada. Até que ele veio até mim e desfez todas as minhas certezas e anseios: disse que eu era a mulher mais linda do lugar e que ele nunca tinha visto nada igual. Elogiou também o meu vestido, disse que todos estavam me olhando e comentando o quanto eu era linda. Descobri que luto era essa sua cara de ressaca e hoje eu estou mais viva do que nunca. 

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